segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Amazônia



















Prece de amazonense em São Paulo
Poema inspirado em Carlos Drummond de Andrade

Milton Hatoum

Espírito do Amazonas, me ilumina,
e sobre o caos desta metrópole,
conserva em mim ao menos um fio
do que fui na minha infância.
Não quero ser pássaro em céu de cinzas
nem amargar noites de medo
nas marginais de um rio que não renasce.
O outro rio, sereno e violento,
é pátria imaginária,
paraíso atrofiado pelo tempo.
Amazonas:
Tua ânsia de infinito ainda perdura?
Ou perdi precocemente toda esperança?
Os que te queimam, impunes,
têm olhos de cobre,
mãos pesadas de ganância.
Ilhas seres rios florestas:
o céu projeta em mapas sombrios
manchas da natureza calcinada.
Tento abraçar a imagem fugidia
de um barco à deriva no mormaço
com os mitos que a linguagem inventa.
Espírito amazonense, tímido talvez,
e desconfiado para sempre,
não me fujas em São Paulo,
nem me deixes à mercê
dos pesadelos que incendeiam o mundo.
Se o Brasil te conhecesse
antes do fim que se aproxima,
salvaria tua beleza? Teus seres desencantados?
Entenderia a ciência tua infinita riqueza?
Abre a janela de um barco
ante meus olhos,
e que ao teu profundo rio conduza
a memória de línguas estranhas
e tantas histórias ocultadas:
Amazonas.

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